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MATEMÁTICA, MÚSICA, MORAL : PITÁGORAS



          "PRESTEM ATENÇÃO: Num triângulo retângulo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos. Ou seja: a² = b² + c².  Está claro?  - Pois este é o enunciado do Teorema de Pitágoras. Enquanto o professor se vira para o quadro-negro, alguns alunos se entreolham: - E quem foi esse Pitágoras?"

Um grego - o nome não engana.
Um matemático - óbvio, caso contrário não faria teoremas.
Um gênio - claro, senão quem se preocuparia com ele e seus teoremas, 25 séculos apos sua morte?
Um astrônomo - bem, vá lá, astronomia e matemática sempre andaram juntas.

   Mas Pitágoras foi mais que isso: conhecia também música, moral, filosofia, geografia e medicina.
Pitágoras viveu há 2500 anos e não deixou obras escritas. O que se sabe de sua biografia e de sua idéia é uma mistura de lenda e história real. A lenda começa antes mesmo de Pitágoras nascer: por volta de 580 a.C., a sacerdotisa do deus Apolo disse a um casal que vivia  na ilha de Samos, no Mar Egeu: "Tereis um filho de grande beleza e extraordinária i nteligência; será um dos homens mais sábios de todos os tempos."
   No mesmo ano, o casal teve um filho. Era Pitágoras. Lenda ou não, a inteligência do jovem Pitágoras assombrava os doutos das melhores escolas de Samos: não conseguiam  responder as perguntas do jovem de 16 anos. Nessas condições, só havia uma coisa a fazer: despachá-lo a Mileto, para que estudasse com Tales - o maior sábio da época, provavelmente o primeiro grago  a se dedicar científicamente aos números.
   E aconteceu que, em pouco tempo, Tales de Mileto reconheceu nada mais a ter a ensinar ao jovem e passou, ele, o Mestre, a estudar as descobertas geométicas e matemáticas do aluno.
    Adulto, Pitágoras resolveu ampliar seus interesses. E começou a somar, além dos números, idéias sobre a ciência e a religião de outros povos. Foi à Síria, depois à Arábia, à Caldéia, à Pérsia, à Índia e ao Egito, onde passou mais de 20 anos e se fez sacerdote para melhor conhecer os mistérios da religião egípcia. Dizem que quando Cambises conquistou o Egito, Pitágoras foi levado em cativeiro para a Babilônia, aproveitando a chance para estudar as ciências naquele país.
    Muito tempo se passou, e por volta dos 50 anos, desejava voltar a Samos e abrir uma escola. Mas Samos tinha mudado e o ditador Policrates, que  governava a ilha, não queria saber nem de escolas e nem de templos. Pitágoras seguiiu adiante, a Crotona, no sul da Itália, onde as melhores famílias da cidade lhe confiavam  prazerosamente a educação de seus filhos.Aí fundou a Escola Pitagórica, a quem se concede a glória de ser a "primeira Universidade do mundo". E Pitágoras pode, por fim fundar sua escola, onde passou a ensinar aritmética, geometria, música e astronomia. E, permeando essas disciplinas, aulas de religião e moral.

   Mais que uma escola, Pitágoras conseguiu criar uma comunidade religiosa, filosófica e política. Os alunos que formava saíam para ocupar altos cargos do
governo local; cientes de sua sabedoria torciam o nariz ante as massas ignorantes e apoiavam o partido aristrocrático. Resultado: as massas retrucaram através da violência e - segundo dizem, incendiaram a escola, prenderam o professor e o mataram. Outros são mais otimistas: contam que Pitágoras foi só exilado para Metaponto, mais ao norte, na Lucânia, onde morreu, esquecido, mas em paz, com mais de 80 anos de idade.


   "Tudo são números." 

   A palavra Matemática (Mathematike, em grego) surgiu com Pitágoras, que foi o primeiro a concebê-la como um sistema de pensamento, baseado em análises dedutivas.
     Pitágoras imaginava os números como pontos, que determinam formas.  E o Universo, o que é, senão um conjunto de átomos, cuja disposição dá forma à matéria?
   De qualquer modo, Pitágoras não se contentava em dizer frases:  demonstrou que era necessário provar e verificar geométricamente um enunciado matemático, ou seja, expressá-lo como teorema. E formulou vários,  além daquele mais conhecido.
Por  exemplo:
 - a soma dos ângulos internos de um triângulo é igual à soma de dois ângulos retos :
   (a + b + c = 180º);
- a superfície de um quadrado é igual à multiplicação de um lado por si mesmo (donde a expressão      "elevar ao quadrado": 2 x 2 = 2²);
- o volume de um cubo é igual à sua aresta multiplicada três vezes por si mesma (2 x 2 x 2 = 2³, o que originou a expressão "elevar ao cubo).

    Pitágoras também mostrou que música e matemática são parentes: o comprimento e a tensão das cordas de uma lira, por exemplo, podem ser convertidos em expressões matemáticas.
    O gênio de Samos era um homem religioso, acreditava na transmigração da alma: quando um homem morre, sua alma passa para outro corpo ou para um animal. Portanto, advogava a reencarnação e a imortalidade da alma (metempsicose). Só pela vida "pura" a alma poderia libertar-se do corpo e viver no céu. E vida pura significava, para Pitágoras, austeridade, coragem, piedade, obediência, lealdade. Dizia a seus alunos: "Honra os deuses sobre todas as coisas. Honra teu pai e tua mãe. Acostuma-te a dominar a fome, o sono, a preguiça e a cólera". Mas acreditava igualmente numa série de superstições: não comer carne por causa da reencarnação, não comer favas, não atiçar o fogo com ferro, não erguer algo caído do chão.
   O melhor meio de purificar a alma, ensinava Pitágoras, era a música. O Universo - afirmava - era uma escala, ou número musical, cuja própria existência se devia à sua harmonia.
   Como astrônomo, seu principal mérito foi conceber o Universo em movimento. Como teórico de Medicina, achava que o corpo humano era constituído basicamente por uma harmonia: homem doente era sinal de harmonia rompida. Como filósofo, deu origem a uma corrente que se desenvolveu durante os séculos seguintes, inspirando - entre os principais pensadores gregos - inclusive o grande Platão.
Ele foi contemporâneo de Tales de Mileto, Buda, Confúcio e Lao-Tsé.

   Pitágoras é o primeiro matemático puro. Entretanto é difícil separar o histórico do lendário, uma vez que deve ser considerado uma figura imprecisa historicamente, já que tudo o que dele sabemos deve-se à tradição oral. Nada deixou escrito, e os primeiros trabalhos sobre o mesmo deve-se a Filolau, quase 100 anos após a morte de Pitágoras. Mas não é fácil negar aos pitagóricos o papel primordial para o estabelecimento da Matemática como disciplina racional. A despeito de algum exagero, há séculos cunhou-se a idéia: "Se não houvesse o teorema de  Pitágoras, não existiria a Geometria.
 
    A Escola Pitagórica ensejou forte influência nos estudos de Euclides, Arquimedes e Platão na antiga era cristã, na Idade Média, na Renascença e até em nossos dias com o Neopitagorismo.

 Pensamentos de Pitágoras
  1. Educai as crianças e não será preciso punir os homens.
  2. Não é livre quem não obteve domínio sobre si.
  3. Pensem o que quiserem de ti; faz aquilo que te parece justo.
  4. O que fala semeia; o que escuta recolhe.
  5. Ajuda teus semelhantes a levantar a carga, mas não a carregues.
  6. Com ordem e com tempo encontra-se o segredo de fazer tudo e tudo fazer bem.
  7. Todas as coisas são números.
  8. A melhor maneira que o homem dispõe para se aperfeiçoar, é aproximar-se de Deus.
  9. A Evolução é a Lei da Vida, o Número é a Lei do Universo, a Unidade é a Lei de Deus.
  10. A vida é como uma sala de espetáculos: entra-se, vê-se e sai-se.
  11. A sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas os homens podem desejá-la ou amá-la tornando-se filósofos.

Versos Dourados de Pitágoras


Ensinamentos da escola pitagórica

01. Honra em primeiro lugar os deuses imortais, como manda a lei.
02. A seguir, reverencia o juramento que fizeste.
03. Depois os heróis ilustres, cheios de bondade e luz.
04. Homenageia, então, os espíritos terrestres e manifesta por eles o devido respeito.
05. Honra em seguida a teus pais, e a todos os membros da tua família.
06. Entre os outros, escolhe como amigo o mais sábio e virtuoso.
07. Aproveita seus discursos suaves, e aprende com os atos dele que são úteis e virtuosos.
08. Mas não afasta teu amigo por um pequeno erro.
09. Porque o poder é limitado pela necessidade.
10. Leva bem a sério o seguinte: Deves enfrentar e vencer as paixões.
11. Primeiro a gula, depois a preguiça, a luxúria, e a raiva.
12. Não faz junto com outros, nem sozinho, o que te dá vergonha.
13. E, sobretudo, respeita a ti mesmo.
14. Pratica a justiça com teus atos e com tuas palavras.
15. E estabelece o hábito de nunca agir impensadamente.
16. Mas lembra sempre um fato, o de que a morte virá a todos.
17. E que as coisas boas do mundo são incertas, e assim como podem ser conquistadas, podem ser   perdidas.
18. Suporta com paciência e sem murmúrio a tua parte, seja qual for.
19. Dos sofrimentos que o destino determinado pelos deuses lança sobre os seres humanos.
20. Mas esforça-te por aliviar a tua dor no que for possível.
21. E lembra que o destino não manda muitas desgraças aos bons.
22. O que as pessoas pensam e dizem varia muito; agora é algo bom, em seguida é algo mau.
23. Portanto, não aceita cegamente o que ouves, nem o rejeita de modo precipitado.
24. Mas se forem ditas falsidades, retrocede suavemente e arma-te de paciência.
25. Cumpre fielmente, em todas as ocasiões, o que te digo agora.
26. Não deixa que ninguém, com palavras ou atos,
27. Te leve a fazer ou dizer o que não é melhor para ti.
28. Pensa e delibera antes de agir, para que não cometas ações tolas.
29. Porque é próprio de um homem miserável agir e falar impensadamente.
30. Mas faze aquilo que não te trará aflições mais tarde, e que não te causará arrependimento.
31. Não faze nada que sejas incapaz de entender.
32. Porém, aprende o que for necessário saber; deste modo, tua vida será feliz.
33. Não esquece de modo algum a saúde do corpo.
34. Mas dá a ele alimento com moderação, o exercício necessário e também repouso à tua mente.
35. O que quero dizer com a palavra moderação é que os extremos devem ser evitados.
36. Acostuma-te a uma vida decente e pura, sem luxúria.
37. Evita todas as coisas que causarão inveja.
38. E não comete exageros. Vive como alguém que sabe o que é honrado e decente.
39. Não age movido pela cobiça ou avareza. É excelente usar a justa medida em todas estas coisas.
40. Faze apenas as coisas que não podem ferir-te, e decide antes de fazê-las.
41. Ao deitares, nunca deixe que o sono se aproxime dos teus olhos cansados,
42. Enquanto não revisares com a tua consciência mais elevada todas as tuas ações do dia.
43. Pergunta: "Em que errei? Em que agi corretamente? Que dever deixei de cumprir?"
44. Recrimina-te pelos teus erros, alegra-te pelos acertos.
45. Pratica integralmente todas estas recomendações. Medita bem nelas. Tu deves amá-las de todo o coração.
46. São elas que te colocarão no caminho da Virtude Divina.
47. Eu o juro por aquele que transmitiu às nossas almas o Quaternário Sagrado.
48. Aquela fonte da natureza cuja evolução é eterna.
49. Nunca começa uma tarefa antes de pedir a bênção e a ajuda dos Deuses.
50. Quando fizeres de tudo isso um hábito,
51. Conhecerás a natureza dos deuses imortais e dos homens,
52. Verás até que ponto vai a diversidade entre os seres, e aquilo que os contém, e os mantém em unidade.
53. Verás então, de acordo com a Justiça, que a substância do Universo é a mesma em todas as coisas.
54. Deste modo não desejarás o que não deves desejar, e nada neste mundo será desconhecido de ti.
55. Perceberás também que os homens lançam sobre si mesmos suas próprias desgraças, voluntariamente e por sua livre escolha.
56. Como são infelizes! Não vêem, nem compreendem que o bem deles está ao seu lado.
57. Poucos sabem como libertar-se dos seus sofrimentos.
58. Este é o peso do destino que cega a humanidade.
59. Os seres humanos andam em círculos, para lá e para cá, com sofrimentos intermináveis,
60. Porque são acompanhados por uma companheira sombria, a desunião fatal entre eles, que os lança para cima e para baixo sem que percebam.
61. Trata, discretamente, de nunca despertar desarmonia, mas foge dela!
62. Oh Deus nosso Pai, livra a todos eles de sofrimentos tão grandes.
63. Mostrando a cada um o Espírito que é seu guia.
64. Porém, tu não deves ter medo, porque os homens pertencem a uma raça divina.
65. E a natureza sagrada tudo revelará e mostrará a eles.
66. Se ela comunicar a ti os teus segredos, colocarás em prática com facilidade todas as coisas que te  recomendo.
67. E ao curar a tua alma a libertarás de todos estes males e sofrimentos.
68. Mas evita as comidas pouco recomendáveis para a purificação e a libertação da alma.
69. Avalia bem todas as coisas,
70. Buscando sempre guiar-te pela compreensão divina que tudo deveria orientar.
71. Assim, quando abandonares teu corpo físico e te elevares no éter.
72. Serás imortal e divino, terás a plenitude e não mais morrerás!

 

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HISTÓRIA DE DEUSES E HERÓIS OGUM: O que veio da áfrica



    HOMENAGEM AO DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA - 20 DE NOVEMBRO

  Quando ele nasceu, os tempos já não eram tão bons para sua gente. Outrora fortes, unidos e independentes, os  yoruba  tinham conhecido a fartura, o poder, a glória, a riqueza material e a cultural; suas tribos chegaram a dominar toda a parte baixa do Rio Niger, até a costa do golfo da Guiné, na África Ocidental;  haviam levantado prósperas cidades - cuja origem estava no antigo reino de Benin, existente ali desde o século XII.
   Quando ele nasceu, porém, muita coisa havia mudado. Lutas internas minaram a união dos yoruba e permitiram que, aos poucos, outro povo viesse a dominá-los. Esse povo era o  fon , que vivia na costa mais a oeste, controlando inicialmente poucas extensões da costa marítima. Mas, melhor adestrados para a guerra, os fon, entre os quais até as mulheres faziam serviço militar obrigatório, derrotaram seus vizinhos, conquistaram-lhes as terras e fundaram um reino autocrático e poderoso. Para marcar sua supremacia, o palácio real dos fon foi erguido sobre as víceras do rei da tribo  - extirpada a ferro e fogo. "Sobre as vísceras de Dã",  no idioma dos fon, diz-se Dã-ho-mé.
   E assim, eternizando o nome do inimigo, passou a se chamar seu reino, que só foi colonizado pelos europeus no século XIX. O nome Daomé foi mantido e perdura até hoje.
   Quando ele nasceu, houve festa. E, conforme a tradição, os pais esperaram três dias até levar a criança ao sacerdote - o babalaô -, a fim de saber  a que divindade, a que orixá, devia ser o recém-nascido dedicado. Muitas horas passaram até que se cumprisse o complicado cerimonial e viesse a resposta. A resposta era uma esperança e uma ameaça: a criança seria protegida por Ogum, o deus da guerra.  Ogum seria seu nome. Um nome que soou como uma profecia de lutas futuras e - quem sabe? - talvez de novos grandes dias para o povo yoruba.

   Ogum cresceu aprendendo as habilidades seculares de sua tribo: seu pai lhe ensinara a trabalhar os metais, e suas peças de cobre eram elogiadas por todos. Jovem ainda, conseguira permissão para casar, o que um yoruba só podia fazer se antes provasse capacidade de produzir bens suficientes para trocá-los por alimentos e roupas. Vieram os filhos. Ogum precisava trabalhar bastante para mantê-los. Precisava ir com mais frequência ao posto de trocas, onde deixava seu produto e recebia o sustento das mãos dos dominadores fon. Numa dessas viagens, viu pela primeira vez  uma gente estranha de que se costumava falar na tribo, mas
que ninguém entendia. Era uma gente sem cor. Como podiam existir homens assim - pensava Ogum - se, como todos sabiam,  Odudua, o sopro divino,  tinha concebido o homem, e esse homem era preto. Mas os brancos ali estavam - com suas roupas pesadas, seus calçados de couro, suas armas de fogo. Eram portugueses,  fixando-se em núcleos  comerciais  ao longo da costa ocidental africana.
   Um dia, logo ao nascer do sol, Ogum repete a rotina de ir ao posto de trocas,  afastado da aldeia. Uma caminhada fatigante, porém indispensável. Só ao cair da tarde Ogum voltaria para ficar com os seus. Mas, quando volta, sua família não está à espera. Nem seus vizinhos. Nem seus amigos. Só alguns velhos, assustados e confusos, permanecem na aldeia. Por eles Ogum descobre o que se passara: soldados daomeanos e homens brancos invadiram a povoação, prenderam e levaram em cativeiro quase todos os habitantes. O que Ogum não ficara sabendo é que os próprios chefes yoruba tinham participado da operação: eles ajudavam a escravizar seus irmãos.
   Só havia uma coisa a fazer, Ogum não tinha dúvidas: ir ao encontro de sua família. Onde ela estivesse. Armou-se de um punhal, invocou a proteção de seu orixá e pôs-se em marcha. O orixá não veio em seu socorro: quando Ogum alcançou a fila de gente que ia devagar pelas trilhas da floresta, o  punhal foi inútil. Logo o bravo yoruba foi dominado - e de que adiantava resistir, se resistência seria a sua morte?  E, morto, como poderia proteger sua mulher e seus filhos?
   Assim, Ogum ficou na coluna dos cativos. Andaram dias e dias; os captores não queriam cansá-los demais, por isso não forçavam a marcha. O rumo era a costa, onde os portugueses tinham vários portos: Lagos, Porto Novo, São João de Ajudá.  Lagos é hoje a capital da Nigéria; Porto Novo, de Daomé. E São João de Ajudá constituiu - até 1964 - um enclave português nas terras dos países independentes da África, murcha reminiscência dos tempos  idos.
   Durante a caminhada, Ogum percebeu que a fuga era impossível. Para os que tentassem escapar, havia apenas um castigo: a forca (ainda hoje, um dos portos da Nigéria se chama Forcados, em memória dos negros que ali perderam a vida para não serem escravos).  Nada restava a fazer, senão andar. Finalmente, chegam a São João de Ajudá. É uma verdadeira fortaleza ao lado da cidade de Ouidah. Os presos são amontoados perto do cais, ali ficam dois dias, até que,  escoltado por guardas daomeanos aparece outro homem branco - o comerciante. Começa a escolha:  homens, mulheres e crianças são agrupados ou separados conforme os interesses do traficante. Os selecionados, Ogum entre eles, são embarcados num navio. Os mais agressivos são postos a ferros;  os demais, simplesmente atirados ao porão. Pouco depois, o veleiro partirá. Destino: a colonia portuguesa chamada Brasil. Onde Ogum irá trabalhar num engenho de açúcar,  sua mulher será escrava de alguma sinházinha, seus filhos - o que será de seus filhos?
                                                               -.-.-.-.-.-.-.-.-.-
   Existiram milhares de Oguns. Trazidos ao Brasil, às ilhas do mar das Caraíbas, aos Estados Unidos, suas história individuais desapareceram no anonimato comum da condição de escravos,  nessa mesma condição em que ajudaram a construir as novas civilizações da América.  Com seu trabalho, principalmente, mas também com seus costumes, suas tradições, suas crenças, sua arte.  Seu rico passado cultural que o Ocidente ignorou ou desprezou durante tantos séculos,  sua organização social que o colonialismo  torceu ou destruiu o quanto pôde.  Mas que, ainda assim, sobrevivem e se revigoram na segunda metade do século XX, quando as nações africanas se fazem independentes. E passam a escrever, eles mesmos, sua própria história.
    Não só os yoruba foram vítimas do tráfico de escravos.  Os fon vendiam também seus irmãos  ewe ou gêge e ainda os fanti axanti, que habitavam o atual território do Togo, da Costa do Marfim, da atual Ghana, e que, entre nós eram  chamados minas
   Os fanti axanti tinham uma cultura muito parecida com a fon-gêge e a yoruba. No Brasil, não conseguiram deixar vestígios claros de suas tradições. Eram tidos como valentes e inteligentes, bons pescadores, conhecedores de cozinha e, no entanto, muito rebeldes à disciplina do trabalho. Além disso, foram ainda escravizados e trazidos para o nosso país os peuls, os mandingas, os haussa - habitantes da atual República do Mali e adjacências-, os tapas, rornu e gurunsi, da mesma origem (no Brasil, todos chamados geralmente de malês). Eram os mais desenvolvidos culturalmente. Muitos sabiam ler e escrever em caracteres arábicos - ao contrário dos donos, quase sempre analfabetos.
   Houve também os escravos da  origem bantu, os angolanos, os  congueses, de acentuada tendência artística. Foram os introdutores da capoeira e do samba. Os nomes umbanda e quimbanda, pelos quais se 
designam as seitas religiosas africanas, também se originaram de linguagens bantu.

    A civilização yoruba foi a mais importante do golfo da Guiné, na época da Idade Média européia. A origem do povo se perde em meio a lendas religiosas; essas contam que os yoruba vieram do nordeste africano - portanto das proximidades do Rio Nilo, primeiro no período que vai dos séculos VI ao X e, depois, no século XIII. O comandante da primeira emigração teria sido justamente Odudua - adorado como um deus. No delta do Rio Níger, os yoruba fundaram o reino de Ife e também o de Benin, onde dominaram a população local (edô).  Mas esses reinos  não formavam um império totalmente unificado. Ao contrário, subdividiram-se em outros, como o de Abeokuta, onde se esconderam muitos escravos fugidos das caravanas. Esse foi o último reino yoruba a cair, sob a pressão da colonização européia; ainda existia em 1914, quando afinal foi conquistado pelos inglêses. Benin ficou como um marco de civilização, na África Ocidental. São famosas suas obras de arte, em bronze, marfim e madeira.
    O deus sem rosto
Na série de deuses yoruba, Olorun está em primeiro lugar. Seu nome quer dizer "Senhor do Céu"  ou  "Mestre do Céu".  Não é figurado por nenhum objeto concreto de culto. Aliás, não se sabe mesmo se Olorun é uma realidade, no sentido do monoteísmo primitivo, ou uma criação dos missionários cristãos, na busca de uma palavra yoruba para a representação de Deus. De qualquer modo, Olorun não é motivo de culto especial na África e apenas algumas formas verbais dos negros brasileiros retém sua imagem.
   Olorun só poderia  comunicar-se  com os homens - de acordo com a idéia que os yoruba tinham do mundo - através de divindades secundárias, os orixás. Isso parece ser a reprodução, no plano religioso, do que se passava na vida civil daquelo povo, na qual o rei se comunicava com seus súditos através de intermediários.
   O maior oráculo da Nigéria - terra dos yoruba, é Ifá.  Não se trata propriamente de um orixá, mas é consultado em todas as ocasiões importantes;  ele diz qual o orixá a quem o recém-nascido deve ser consagrado; prediz o tempo, as calamidades, as doenças; indica os deuses que foram ofendidos e a quem se deve oferecer sacrifícios. Os sacerdotes de Ifá são justamente os babalaôs.

   Diz a lenda que, dos dois grandes orixás Obatalá e Odudua, nasceram Aganju e Yemanjá.  Obatalá, o céu, que também se chama Orixalá, é o protetor das aldeias e dos templos e se representa, nas pinturas, como um cavaleiro armado de lança. Quanto a Odudua, a terra, tem funções de fecundação e reprodução. Nesses mitos, Odudua é tida como mulher de Obatalá - sendo o casal a união entre o céu e a terra.  De Aganju e Yemanjá, vem Orungan; este desrespeita sua mãe, que morrendo, faz nascer quinze orixás - representantes de quinze dinastias dos reinos yoruba, tais como:  Dada, deus dos vegetais;  Xangô, deus do trovão;  Ogum, deus da guerra e do fogo;  Olokum, deus do mar;  Obá, deusa do rio Obá;  Orishako, deus da cultura;  Oxossi, deus da caça;  Ajê Lalunga, deus da riqueza. 
   O orixá protetor de alguém deve ser cultuado por toda a vida. Os rituais consistem  em oferendas do sacrifício de animais (aves, cabras, carneiros), música acompanhada por instrumentos de percussão (atabaques, agogôs, etc.) e danças. As roupagens são características, distinguindo-se os orixás pelas cores. Máscaras, esculturas de bronze, ferro, terracota e madeira expressam os deuses. Mas, apesar das oferendas e sacrifícios, os orixás não conseguiram proteger os yorubas. 

   Os fon eram os intermediários no comércio de escravos, vendendo os yoruba aos negreiros;  vendiam, do mesmo modo, os ewe ou gêge, que pertenciam ao mesmo grupo étnico deles, falando quase a mesma língua. Isto não quer dizer, porém, que todos os fon estivessem fora do perigo da escravidão. Muitos deles vieram também para o Brasil como escravos, vendidos pelos seus próprios chefes. E em tão grande número que a cultura negra sobrevivente, em nosso país, se chama gêge-nagô, incluindo-se os fon entre a designação geral gêge. Mas muitos voltaram, principalmente depos de libertados. E até hoje, no Daomé e no Togo, há regiões inteiras onde se fala português e a população tem orgulho da ascendência brasileira.

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HUMANIDADE - O COMEÇO

   Foi por volta de 50.000 a.C. - início do Paleolítico Superior - que o homem assumiu sua forma atual, a de Homo Sapiens.  Desde então, por muito tempo, a natureza foi o único recurso para a sua sobrevivência. Vivia como os animais: recolhia alimentos aqui e ali, improvisadamente, ignorando sua maior virtude, a da multiplicação pelo cultivo. Não teve consciência, tampouco, de que era prejudicial abater indiscriminadamente os animais para comer. Mantendo-os vivos, teria uma fonte quase inesgotável de alimento, como o leite, e de vestimenta, como a lã.
   Por seu desconhecimento, viveu em nomadismo: esgotados os produtos da terra ou os animais de uma determinada região, rumava para outros lugares, para outros mananciais.  As sociedades desse tempo se organizavam em função da economia de coleta, inclusive no tocante ao desempenho de funções, pois já então se delineava, embora ainda confusamente, uma rudimentar divisão do trabalho.
   O critério para a especificação dos serviços era a diferença de sexo: os homens caçavam, as mulheres se incumbiam de procurar raízes, ervas e frutas, cavoucando o chão ou investigando árvores. A única especialização "profissional" consistia na produção familiar do equipamento necessário:  ferramentas rudimentares de madeira e de pedra. Grupos mais evoluídos chegaram até o arco.
   O desenvolvimento dessas culturas esteve entravado pela economia de coleta, mesmo as mais significativas, por ter aproveitado condições que permitiram a subsitência de um grande número de indivíduos. Mas o crescimento demográfico,  nessa e nas demais comunidades, era limitado e por vezes nulo.
A vida se manteve assim até o Período Neolítico, ou da pedra polida. Então, uma inovação praticamente revolucionária surgiu na zona do Mediterrâneo Oriental,  na Palestina,  Síria,  Iraque e  Irã.   Data: cerca de 8.000 a.C..  Pois nas escavações arqueológicas de Jarmo, no Iraque, foram descobertos grãos de trigo, cuja idade é de aproximadamente 6.000 anos. É que as mulheres de então, ao pesquisarem o solo em busca de alimentos, encontraram sementes silvestres de que se originaram o trigo e a cevada.  E descobriram que, plantando-as, obtinham bom alimento. O mesmo se deu depois com a ervilha, o feijão, a lentilha, o arroz, o milho, o inhame, a mandioca,  cabaça, etc.. O que nos parece agora de evidência natural  - a germinação das plantas comestíveis - constituiu um enorme avanço na evolução do homem,  pois este passou a participar do trabalho da natureza, determinando-o.
   A participação ativa, e não mais passiva, do homem em relação ao ambiente, desencadeou uma farta produção de víveres e utensílios. Mesmo assim, ainda não existia uma especialização de funções na aldeia:  a divisão do trabalho ainda se faz com base no sexo dos indivíduos: as mulheres lavram parcelas de terra, moem, cozinham, fiam, tecem, confeccionam roupas, moldam recipientes de argila, preparam adornos e objetos mágicos;  os homens capinam, constroem choças, cuidam do gado, caçam, fabricam armas e ferramentas:  machados de pedra, afiados por meio do polimento (que os arqueólogos reputam como típico instrumento neolítico),  implementos para lavrar o solo, para segar, armazenar colheitas e transformá-las em
alimentos; para cavoucar a terra existia um bastão pontiagudo de madeira, ao qual era acrescentada uma pedra perfurada na ponta;  toscas enxadas, rudes foices e arados são os demais recursos utilizados por essse homens.  E, ao mesmo tempo que o homem descobria a fertilidade do solo, apossava-se da reserva viva e dinâmica representada pelos animais: domesticou cabras, ovelhas, vacas e cerdos sevagens,  pela primeira vez na Ásia anterior e na região mediterrâena, na Europa. E foi mais longe: compôs substâncias e matérias inexistentes na natureza:  ao aquecer a argila quebradiça, a mulher primitiva provocou uma mudança química na composição desse material, que ganhou em plasticidade e maleabilidade. Daí para o desenvolvimento da cerâmica e olaria foi uma questão de tempo.

   Assim,  pelo exercício da cultura mista - agricultura e domesticação, o homem não precisava mais abandonar o seu habitat, a não ser esporádica e eventualmente. Em uma palavra, sedentarizou-se. As sociedades já estratificadas, dividiram-se entre governantes e governados, em que a organização não era mais baseada no clã ou parentesco. Em lugar de uma única cultura, registra-se um conjunto de culturas, provavelmente, distintas entre si e com traços comuns que as identificavam; mas a aplicação regional dava expressões diferentes a esse princípios comuns; o cultivo, a olaria, a construção de choças, o aguçamento do machado pelo polimento. As comunidades em geral,  eram pequenas, aldeias ou vilas de extensão variável.As choças eram de caniço, madeira ou pedras, recobertas de barro. Cada aldeia se auto-abastecia com os recursos existentes dentro de seus limites ou redondezas, sem intercâmbio com outras aldeias e comunidades. Essa auto-suficiência e a ausência de especialização das funções constituem as principais características deste peródo Neolítico. Entretanto, nas aldeias e tumbas neolíticas mais primitivas, foram achados materiais trazidos de grandes distâncias. Isso prova que a auto-suficiência não era completa. E nem sempre eram artigos não essenciais: por exemplo, a pedra de cortar (obsidiana), da Ásia anterior e da Europa Central,  foi encontrada em aldeias longínquas;  nestas regiões foram exploradas pedreiras, e dessa atividade nasceram grupos mineiros, com técnicas complexas de perfuração de poços e abertura de galerias subterrâneas. Do produto extraído se fabricavam machados, depois distribuídos por extensas zonas. É provável que alguns grupos mais primitivos tenham convivido com outros mais evoluídos e estabeleceram relações de troca. Assim, apesar da inicial auto-suficiência, estabeleceu-se entre vários núcleos um certo comércio de artigos não essenciais.  Os grupos mais desenvolvidos relacionavam-se de modo mais intenso do que os grupos coletores. Mas o contato com o mundo exterior era sempre acidental e ocasional. Durante a maior parte do tempo, tiveram qua adaptar seu modo de vida a um ambiente limitado. E as culturas se diversificaram porque cada ambiente oferecia a cada comunidade perspectivas peculiares de descobertas e invenções.
     Ao que parece, a estrutura do clã e do parentesco, nas comunidades, prevaleceu durante a revolução neolítica. A terra é propriedade do clã que a cultiva, enquanto as pastagens pertencem a todo o grupo. Em grupos estritamente cultivadores, o parentesco era fixado pela linha materna de descendência,  graças ao importante papel que a mulher desempenhava na economia coletiva. Era o matriacardo. Quando predominaram as atividades de produção, a liderança econômica e social da comunidade passa para os homens e se constitui o patriarcado. Todas essas instituições advieram da adoção da cultura mista.

   Aos poucos, a dupla direção da economia (agricultura e pecuária)  trouxe contradições. O aumento da população tornou necessária a expansão territorial. Só se poderia alimentar um maior número de indivíduos se fossem cultivadas novas terras,  e descobertas novas pradarias para os rebanhos e manadas. Tinha-se o domínio sobre as provisões e o ambiente, era até possível fazer previsões; em compensação, secas, inundações, tempestades e pragas podiam frustar irremediavelmente os planos. Também as reservas eram reduzidas demais para uma situação dessas.  Por outro lado, muitas vezes os grupos produtores tentam utilizar-se, para sua expansão, dos grupos coletores. Nem sempre pacifícamente: todos competem por uma
terra facilmente cultivável.  À medida que escasseiam as terras desocupadas e de fácil cultivo, cria-se um clima de guerra. Na realidade, a economia neolítica não oferecia nenhum estímulo material para produzir mais do que o camponês e sua família necessitavam até a próxima colheita. A comunidade pôde sobreviver sem produzir excedentes, o que restringe sua produção, e portanto sua evolução.
   As contradições só seriam superadas com o advento do excedente, ou seja, de uma produção superior às necessidades. Isso foi obtido através de um procgresso técnico e em especial pela utilização do metal  (de início, o cobre), com a consequente introdução da metalurgia.

    As atividades econômicas e a organização social sofreram mudanças substanciais. Outros setores de produção, extra-alimentares, são revistos e repensados. Concretiza-se e acelera-se o processo de divisão do trabalho, em gestação desde a sociedade neolítica comunitária;  a primeria distinção nítida foi a que se verificou entre as funções espirituais e as materiais.
    Já na sociedade neolítica, o guardador dos celeiros, o distribuidor de alimentos, enfim, o responsável pela subsistência da comunidade, tinha dentro dela um papel próximo ao de sacerdote. Como tal, encarregava-se do estudo do tempo de plantação e colheita, engendrando práticas mágicas  para garantir seu prestígio. Aos poucos, sua atividade se apura cada vez mais,  até constituir prerrogativa de uma figura destacada das outras: o sacerdote.  Quando o metal foi incorporado ao acervo da humanidade, surgiu nas comunidades uma classe inexistente até então: os metalúrgicos, que são os primeiros especialistas, os "técnicos" primitivos. Os "mistérios" do ofício eram transmitidos em herança, seu conhecimento é patrimônio de clãs privilegiadas. É que a metalurgia é a primeira ocupação não-doméstica, destinada a satisfazer a demanda de toda a sociedade. Por conseguinte, os que a ela se dedicam devem viver do excedente da produção do restante da coletividade. Depois dos sacerdotes, talvez seja essa a primeira camada social a se afastar da mera produção de alimentos. Se a nova classe depende dos agricultores para subsistir, em troca oferece os utensílios que produz,  para facilitar a produção de alimentos.
   A adoção de ferramentas abala o regime de auto-abastecimento restrito. Cada indíviduo sacrificará sua independência, em toca de ferramentas  que não pode produzir por conta própria: só por meio de troca. É preciso produzir um excedente alimentar para que ele possa funcionar como objeto de troca de utensílios.
   O mesmo se dá com a aldeia. O minério geralmente está localizado em montanhas áridas, e a matéria-prima quase sempre deve ser importada: seu uso regular cria um comércio de produtos essenciais. Uma unidade  regional se vê na necessidade de obter materiais do exterior; é levada a intensificar a produção de alimentos, para manter os seus especialistas e para trocar com materiais de outras aldeias.

    O homem já conhecia a guerra. Agora, com a evolução da economia, recorre a ela cada vez com mais frequência e ardor. Os guerreiros, antes escalados para a proteção dos companheiros lavradores, passam a formar uma camada social isolada. O metal foi ainda mais valorizado, porque as armas que dele se faziam eram mais eficazes. A divisão do trabalho, além de fixar as atribuições de cada indivíduo ou grupo social - sinônimo de especialização - acarretou a partilha dos frutos do trabalho - sinônimo de propriedade. A partir daí, a história dispara; a roda, o carro de bois, o burro de carga, o barco a vela, são as aquisições que vão se sucedendo.
    Os vales dos Rios Nilo, do Tigre-Eufrates e do Indo foram o berço do fenômeno da produção, há mais de 5 mil anos. É nessa data que se registra a existência das primeiras cidades da história. Isso porque a produção agrícola assegurava condições de vida a uma população de artesãos especializados, comerciantes, sacerdotes, funcionários. Vestígios da cidade mais antiga conservaram-se em Jericó, nas proximidades do Mar Morto, na Palestina. Eles testemunham as superposições de cidades no mesmo espaço. A primeria delas, cujos edíficios e muros de barros, entrou em declínio; outra foi erigida sobre suas ruínas; outra sobre essa, e o processo repetiu-se várias vezes. Há depósitos de ruínas com l3 m de altura, servindo de base para outros edíficios: são os "tel" - colinas - ainda, frequentes em vários pontos de Israel e da Jordânia. 

   Nas diversas e sucessivas camadas dos "tel" podem ser analisadas as radicais modificações da cultura. Elas são o mais eloquente atestado de sedentarização dos povos,  no marco zero de uma história que não tem mais fim...


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HISTÓRIA DE DEUSES E HERÓIS - ÍSIS

     Embora o mito de Ísis e Osíris fosse conhecido por todo o Egito, nenhuma fonte egípcia nos fornece todos os detalhes da história essencial. Para encontrá-las em fontes seguras antigas é necessário recorrer a Plutarco (46 - 126 d.C.), filósofo e prosador grego do período greco-romano. Em "Sobre Ísis e Osíris", obra dedicada a Klea, uma sacerdotisa de Ísis e Osíris, ele apresenta um registro sobre tal.
     O texto abaixo foi adaptado de Moralia, de Plutarco (traduzido por Frederick Cole Babitt),  constante no livro OS MISTÉRIOS DE ISIS - SEU CULTO E MAGIA  (Detraci Regula).

REGISTRO DE PLUTARCO SOBRE A HISTÓRIA DE ÍSIS E OSÍRIS

(...) O Sol, quando ficou sabendo do relacionamento de GEB, O Deus da Terra,  com NUT, a Deusa do Firmamento,  invocou uma maldição sobre ela para que não pudesse dar à luz uma criança em qualquer mês  de qualquer ano; mas Thoth, que estava apaixonado pela deusa, casou-se com ela e, mais tarde, jogando com a Lua, ganhou dela a sétima parte de cada um dos seus períodos de iluminação. E de todas as vitórias, ele criou cinco dias e os intercalou, somando-se aos trezentos e sessenta e cinco dias. Os egípcios, até hoje, celebram esses cinco dias como o nascimento dos deuses. Eles relatam que no primeiro dia nasceu Osíris, e na hora de deu nascimento uma voz proclamou: "O Deus de tudo avança para a Luz".  No segundo dia, Hórus nasceu (alguns o chamaram de Apolo e outros de Hórus mais velho). No terceiro dia, Seth nasceu. No quarto dia, nasceu Ísis, nas regiões onde sempre há umidade; e no quinto dia nasceu Néftis (a quem foi dado o nome de Finalidade ou Afrodite, e alguns outros a chamaram de Vitória). É relatado que Néftis se tornou mulher de Seth, mas Ísis e Osíris se apaixonaram e se uniram no ventre da mãe antes de nascer. Hórus nasceu desta união e foi chamado de Hórus mais velho pelos egípcios, e Apolo pelos gregos.

  Um dos primeiros atos atribuídos a Osíris em seu reinado foi livrar os egípcios de seu modo rude e desamparado de viver. Ele fez isso mostrando-lhes os frutos do cultivo, dando-lhes leis e ensinando-lhes a honrar os deuses. Mais tarde, ele viajou por toda a terra, civilizando-a sem a menor necessidade de armas, mas atraindo as pessoas através da fala encantadora e persuasiva combinada com canções e todos os tipos de música.. Durante sua ausência, Seth não tentou praticar nenhum mal, porque Ísis, que governava, estava vigilante e alerta, mas quando o rei voltou para casa, Seth elaborou um plano traiçoeiro e reuniu um grupo com setenta e dois conspriradores. Ele também contou com a ajuda de uma rainha etíope que estava no Egito naquele momento, e cujo nome seria Aso. Seth, tendo medido secretamente o corpo se Osíris e preparado uma bela arca do tamanho correspondente, artistícamente ornamentada, fez com que ela fosse levada à sala onde as festividades aconteciam.Os participantes admiraram muito a arca e Seth prometeu em tom jocoso que a daria de presente àquele cujo corpo se encaixasse perfeitamente dentro da arca. Todos tentaram, mas ninguém conseguiu: então Osíris entrou na arca e se deitou, e os conspiradores correram e a lacraram. Depois levaram a arca para o rio e a soltaram no mar através da foz Tanitic. Até hoje os egípcios consideram essa foz odiosa. Essa é a tradição. É ainda relatado que a data em que isso acontecera foi o décimo dia de Athir, quando o sol passa por Escorpião, e o vigésimo oitavo ano do reinado de Osíris. Os primeiros a descobrir o acontecimento e a levar a notícia ao conhecimento dos homens foram os pans e sátiros que viviam na região próxima a Chemmis, e por essa razão até hoje a repentina confusão e desespero de uma multidão recebe o nome de pânico.  Quando Ísis soube o que aconteceu, imediatamente cortou uma das tranças e vestiu um traje de luto, em um local onde a cidade ainda hoje tem o nome de Copto. Outros acreditam que o nome significa "privação", porque os egípcios expressam esse estado com a palavra Koptein. Mas Ísis procurou a arca por todos os lugares, perguntando sobre seu paradeiro a qualquer pessoa que encontrava, inclusive crianças pequenas. As crianças disseram ter visto a arca e contaram a Ísis o nome da foz do rio através da qual os amigos de Seth jogaram a arca no mar. Desde então os egípcios acreditam que as crianças pequenas têm o poder da profecia e tentam adivinhar o futuro através de presságios encontrados nas palavras das crianças, principalmente quando elas estão brincando em lugares sagrados e gritam qualquer coisa que lhes venham à mente.

(A história também conta que quando Ísis descobriu que Osíris havia se deitado com sua irmã acreditando tratar-se de Ísis, e viu a prova na guirlanda de flores esquecida por Néftis, procurou a criança nascida dessa união, porque Néftis a abandonara imediatamente após o nascimento, por temor a Seth. E quando o menino foi encontrado, após muitas dificuldades e problemas, com a ajuda de cães que conduziram Ísis até ele, foi criado pela deusa e tornou-se guardião e auxiliar de Ísis, recebendo o nome de Anúbis. Acredita-se que ele proteja os deuses do mesmo modo que os cães cuidam dos homens.)

   Mais tarde, segundo o relato,  Ísis descobriu que a arca fora levada pelo mar até a terra de Biblos, e que as ondas gentilmente a depositaram no meio de uma moita de urze. A urze, em pouco tempo, cresceu e se transformou em um belo e grande tronco que envolveu a arca, escondendo-a. O rei daquele país admirando o tamanho da planta, cortou a parte que envolvia a arca, agora totalmente escondida; esta parte foi usada como um pilar para apoiar o telhado do palácio. Ísis tomou conhecimento desses fatos através da inspiração divina de Rumor e, seguindo para Biblos, sentou-se junto a uma nascente, traída e em lágrimas, não conversou com ninguém, exceto as servas da rainha, a quem elas tratou com gentileza, trançando-lhe os cabelos e dando-lhes uma maravilhosa fragrância de seu próprio corpo. Mas quando a rainha observou as servas, foi tomada de um anseio pela mulher desconhecida, pelo penteado e pela fragrância de ambrosia. Ísis foi chamada e tornou-se tão íntima da rainha que esta confiou-lhe seu bebê para tomar conta. Dizem que o nome do rei ara Malcander; alguns afirmam qua a rainha se chamava Astarte, outros a chamam de Saosis, outros, ainda, de Nemanus, a quem os gregos chamavam de Atenas.

  A história conta que Ísis amamentou a criança, oferecendo-lhe o dedo em vez do seio, e à noite queimava as porções mortais de seu corpo. Ela própria se transformava em andorinha e voava ao redor do pilar em prantos e lamentações, até que a rainha, vendo o bebê em chamas, gritou e, portanto, privou-o da imortalidade. Então a deusa se revelou e pediu o pilar que servia de suporte para o telhado. Moveu-o com grande facilidade e cortou a madeira que cercava a arca: após envolver a madeira com um tecido de linho e derramar perfume sobre ela, a deusa deixou-a aos cuidados dos reis; e até hoje o povo de Biblos venera a madeira que preservou o santuário de Ísis. Depois, a deusa se jogou sobre o caixão, com um lamento tão horrível que o filho mais novo dos reis morreu na mesma hora. Ísis ficou com o filho mais velho e, tendo colocado o caixão no barco, partiu do país. Como o Rio Phaedrus provocava um vento muito forte pela manhã, a deusa ficou com raiva e secou seu fluxo. No primeiro local onde encontrou privacidade, ela abriu a arca e encostou o rosto no de Osíris, acariciando-o e chorando. Uma criança aproximou-se silenciosamente e viu o que havia dentro da arca. Quando a deusa percebeu isso, virou-se para a criança com olhar de raiva; esta, não resistindo ao medo, morreu. Alguns afirmam que o menino caiu no mar. Ele também recebe honras por causa da deusa, pois acredita-se que Maneros, sobre quem os egípcios cantam nas festividades, é essa criança. Outros, no entanto, dizem que o nome do menino era Palestino ou Pelúsio, e que a cidade fundada pela deusa recebeu o nome em homenagem a ele. Conta-se ainda, que esse Maneros, o tema das canções egípcias, foi o inventor da música. Segundo os relatos, Ísis seguiu para o local onde estava seu filho Hórus, criado por Buto, e colocou a arca em um local escondido; mas Seth, que caçava à noite sob a luz da lua a encontrou por acaso. Reconhecendo o corpo, ele o dividiu em catorze partes e as espalhou em diferentes locais. Ísis descobriu o que aconteceu e saiu em busca das partes novamente, navegando pelos pântanos em um barco de papiro. É por isso que as pessoas que navegam nesse tipo de barco não são atacadas por crocodilos, uma vez que essas criaturas mostram temor ou respeito à deusa.

O resultado do desmembramento de Osíris é a existência de muitos supostos túmulos do deus espalhados por todo o Egito, porque Ísis organizava um funeral cada vez que encontrava uma parte do corpo em um local diferente. A única parte do corpo de Osíris não encontrada por Ísis foi o membro masculino, porque ele fora imediatamento jogado ao rio e devorado pelos peixes. Por esse motivo, os egípcios se abstêm de ingerir certos peixes de água doce. Mas Ísis fez uma réplica do membro e consagrou o falo, em cuja honra os egípcios até hoje celebram um festival. Tempos depois, Osíris, vindo do outro mundo, chegou até Hórus, treinando-o para a batalha. Um dia, Osíris perguntou a Hórus o que ele considerava a  mais nobre das coisas. Quando Hórus respondeu: "Vingar o pai e a mãe pelo mal a eles causado", Osíris perguntou-lhe que animal seria o mais útil para a batalha; e quando o rapaz respondeu: "o cavalo", Osíris ficou surpreso e perguntou por que não seria o leão. Hórus respondeu que o leão seria um animal muito útil para o homem que precisasse de ajuda, mas que um cavalo era melhor para derrubar o ataque inimigo e aniquilá-lo. Osíris ficou muito satisfeito com a resposta, pois sentiu que Hórus já estava preparado. Conta-se que, assim como muitos estavam se aliando a Hórus, a concubina de Seth, Thoueris, também o fez; e uma serpente que a perseguiu foi cortada em pedaços pelos soldados de Hórus, e agora, em memória desse acontecimento, as pessoas atiram uma corda ao solo e a cortam em pedaços.
 A batalha durou muitos dias e Hórus venceu. Contudo, Ísis, a quem Seth foi entregue acorrentado, não ordenou sua execução, mas o deixou livre. Hórus não pôde aceitar isso e, enraivecido, arrancou o diadema real da cabeça da mãe; mas Toth colocou no lugar do diadema um elmo semelhante à cabeça de uma vaca.

   Seth acusou formalmente Hórus de ser uma criança ilegítima, mas com a ajuda de  Toth para defendê-lo, os deuses decidiram que Hórus era legítimo. Seth foi, portanto, derrotado em mais duas batalhas.
   Outras histórias semelhantes a essa são relacionadas a Seth; o modo como ele guiado pelo ciúme e hostilidade, praticou atos terríveis, e por trazer absoluta confusão sobre as coisas, encheu toda a Terra e o oceano com doenças, sendo punido depois. Mas a vingadora, irmã e mulher de Osíris, após extinguir e suprimir a loucura da fúria de Seth, não ficou indiferente `as dificuldades e lutas pelas quais ela passou, nem às suas andanças ou aos muitos atos de sabedoria e feitos de bravura: nem tampouco aceitaria ficar no esquecimento e silêncio por eles, mas integrou-se nas mais sagradas representações dos ritos e de suas experiências à época, e os santificou, tanto como uma lição de religiosidade quanto um encorajamento para homens e mulheres que se encontrem no meio de uma calamidade semelhante. Ela e Osíris, por suas virtudes transformados de semideuses em deuses,  não impropriamente desfrutam de honras duplas,  e seus poderes se estendem para todos os lugares, mas são maiores nas regiões acima e abaixo da Terra.

(deTraci Regula  é sacerdotida da Irmandade de Ísis desde 1983 e recebeu o título de reverenda do templo)

Paralelos com a Virgem Maria


  Embora a Virgem Maria não seja idolatrada pelos cristãos (é venerada tanto pelos católicos quanto pelos ortodoxos), o seu papel, como figura de mãe compassiva, tem paralelos com a figura de Ísis. O historiador Will Durant observou que "os primitivos Cristãos por vezes fizeram os seus cultos diante de estátuas de Ísis amamentando o filho Hórus, vendo nelas uma outra forma do nobre e antigo mito pelo qual a mulher (isto é, o princípio feminino) é a criadora de todas as coisas, tornando-se por fim, a "Mãe de Deus"".
  Isto é fruto da exposição dos primitivos cristãos à arte egípcia. Uma pesquisa com "os vinte principais Egiptólogos", conduzida pelo Dr. W. Ward Gasque, um erudito cristão, revelou que todos os participantes reconheceram "que a imagem de Ísis com o bebê Hórus influiu na iconografia cristã da Virgem e o Menino", mas que não houve nenhuma outra semelhança, como por exemplo, que Hórus tenha nascido de uma virgem, que tenha tido doze seguidores, ou outras.

Fonte: Wikipédia
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 " Eu estou com você, Lucius, movida pelas suas orações, eu, que sou a mãe do Universo, a senhora de todos os elementos, a primeira filha do tempo, a mais alta das divindades, a rainha dos mortos, a principal de todos os seres divinos, a forma única que funde todos os deuses e deusas; eu, que ordeno por meu desejo as alturas estreladas do céu, as brisas saudáveis do mar e o horrível silêncio dos que habitam o submundo: minha divindade é adorada em todo o mundo em formas variadas, em ritos diferentes e com vários nomes distintos. "
Ísis, a seu adorador Lucius, em Metamorfose, de Apuleius.

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HISTÓRIA DE DEUSES E HERÓIS - EGITO/AKHENATON

A história do Egito antigo registrou no século XIV a.C. uma inesperada movimentação: o reinado de Amenófis IV, ou Akhenaton, período que marcou a implantação da primeira religião monoteísta do mundo. As mudanças feitas por Akhenaton, que atingiram inclusive as artes, desapareceram ao final de seu governo tão repentinamente quanto surgiram.

AKHENATON
NO REINO DO DEUS SOL

No Egito, terra onde floresceu a maior civilização da Antiguidade, existem centenas de cidades abandonadas, algumas cobertas pelas areias do deserto, outras vizinhas de localidades modernas visitadas por turistas. Entre tais cidades mortas existe uma que constitui um capítulo à parte na história da humanidade, pois foi construída para ser a sede de uma religião nova e revolucionária, sonho de um faraó da XVIII Dinastia, que não pertencia àquela época. São ruínas situadas à margem direita do Rio Nilo, local que os mapas assinalam com a denominação de TELL-EL-AMARNA.
O soberano que ordenou a construção da cidade, chamada então Akhetaton, foi batizado com o nome de Amenófis IV. Não há certeza sobre o ano de seu nascimento. Ele era o herdeiro legítimo do Alto e Baixo Egito, que seus pais, o faraó Amenófis III e a Rainha Tii, governaram de 1413 a.C. até l377 a.C.. O Egito de então dominava a Núbia até a Síria, o Sudão, na região de Méroe, e influenciava todo o Oriente.
O príncipe foi uma criança enfermiça, franzina, porém dotada de bastante personalidade e força de vontade. Numa época em que os sacerdotes de Tebas (a capital do império) possuíam grande poder, o jovem não manifestava temor diante dos deuses, e pouco comparecia às cerimônias realizadas no grande Templo de Amon, principal divindade do panteão egípcio da época.
Amenófis IV subiu ao trono com seu pai ainda vivo, exercendo durante alguns anos a co-regência - uma prática comum no Novo Império, que visava dar ao futuro  governante uma vivência maior frente aos problemas do reino.  Este governo conjunto começou por volta de 1377 a.C.. O príncipe, que era muito jovem - tinha 12 ou 13 anos - estava casado com uma menina da mesma idade, chamada Nefertiti.

A origem de Nefertiti não é bem conhecida, mas uns consideram que ela seria egípcia, de sangue nobre, embora não pertencendo à casa real, ao passo que outros consideram que ela seria uma princesa estrangeira. A falta de documentos que possam elucidar a questão dificulta a solução deste mistério.

Durante os primeiros anos de seu governo, o jovem faraó nada realizou de extraordinário. Nos relevos ele aparece representado caçando leões ou combatendo povos bárbaros. Mas esse período deve ter sido de curta duração, e passados poucos anos o rei já era retratado entre os membros de sua família, primeiro com os pais e posteriormente junto à mulher e às filhas. Nessa nova fase, o soberano mostra um aspecto físico diferente, um corpo disforme, pernas magras e ventre proeminente, constratando com as representações habituais dos governantes - personagens formosas e isentas de defeitos físicos, como se poderia esperar de um deus vivo. Um outro detalhe torna Amenófis IV diferente de seus antecessores. Ele não demonstra respeito por Amon, e desde cedo procura os templos em que existiam imagens de Aton - divindade regional antiga, que tinha o Sol como o verdadeiro e único poder criador, e que não era venerado pelo clero de Tebas. Tais atitudes devem ter preocupado os sacerdotes de Amon, que passaram a prestar mais atenção às ações do Soberano, já considerado suspeito para eles. Para o clero tradicional, deve ter causado inquietação a escolha da cidade de Hermontis para a cerimônia de coroação do novo faraó: isso quebrava a tradição de realizar a cerimônia em Terbas, no templo de Amon. Amenófis IV preferiu outra cidade, justamente no Templo do Sol. Obedecendo ao protocolo, o sumo-sacerdote de Amon se deslocou para o local da coroação, mas o soberano apenas realizou sacríficios em honr ao Sol, não solicitando as bençãos de Amon distríbuidas pelo sacerdote que o representava.

Não se conhece a duração exata do reino conjunto, mas parece ter sido de seis anos. Findo esse tempo, Amenófis III desapareceu de cena, embora não haja indicação de que falecera. Nessa époica, o  novo rei organizou sua sed (a tradicional cerimônia que os faraós realizavam após vários anos de governo, objetivando revitalizar as forças mágicas e recarregar as energias). Estranhamente, Amenófis IV determinou sua  sed no início de seu governo, como se buscasse forças suplementares para uma missão maior. Durante as cerimônias mágico-religiosas do sed, o faraó inaugurou um novo templo em Tebas, dedicado ao Deus-Sol e construído expressamente para a ocasião. Nos meses seguintes ele dirigiu-se constantemente para o local, permanecendo durante várias horas em seu interior, rezando ou meditando. Passado algum tempo, informou aos ministros que resolvera transferir a capital para uma nova cidade, a qual abrigaria a Casa Real e o corpo de servidores diretos do rei. Após sua morte, ele desejava ser enterrado nessa nova cidade. O local escolhido pelo faraó para a capital do reino situava-se numa fértil planície, com árvores e fonte de água. Sua posição à margem do Nilo permitia que os materiais de construção chegassem dos mais diversos pontos do Oriente, num fluxo constante. Além da mão-de-obra normal foram empregados prisioneiros de guerra e presos comuns, o que permitiu uma progressão bastante rápida. Logo no ínicio dos trabalhos o rei informou que a cidade chamar-se-ia Akhetaton  (o "horizonte de Aton"), o que desagradou o clero e surpreendeu o povo.

Nesse período, Amenófis IV não deixou transparecer a totalidade de seu projeto. Os documentos da época não falam da reforma religiosa que estava sendo preparada, mas após quatro anos, quando a cidade já podia receber a família real (visto estarem concluídos o palácio, o quartel da guarda e alguns templos), Amenófis IV comunicou que iria para a nova capital. Mudara seu nome para "Akhenaton"  ("Aton está satisfeito") e pretendia dedicar-se  ao serviço de seu deus, do qual  seria o sumo-sacerdote. Na mesma ocasião, informou que em sua cidade só existiriam templos dedicados a Aton. Com tais medidas, o rei tornava-se o senhor temporal e religioso do Egito, impedindo que, em seu culto, houvesse dualidade e poderes entre o governo civil eo religioso.

A cidade acolheu os trabalhadores e uma série de artistas excepcionais, agora libertos das rígidas normas que agrilhoavam as artes. Pintores e escultores desenvolveram um novo estilo, que os arqueólogos chamam de "Estilo de Amarna", e o resultado foi um movimento semelhante ao Expressionismo. O próprio soberano era retratado de forma naturalista, mostrando suas características físicas e deformidades, contrariando a tradição que apresentava os faraós como deuses, perfeitos e belos. Os escultores retrataram a família real, e o mais perfeito exemplo da arte de Amarna, foi o busto da rainha Nefertiti, descoberto pela expedição germânica de 1886 no atelier do escultor real, Tutmósis, junto a aoutras obras, criadas pelo mestre e discípulos. 

Os sacerdotes de Amon iniciaram uma campanha contra a nova religião, embora mantendo a necessária cautela para não romperem de vez com o faraó.  Akhenaton não deu imprtância aos ataques e tomou outras medidas de impacto, como a de ordenar que no Egito só seria adorado um deus, Aton - medida que não foi acatada senão na capital. E enquanto o rei prosseguia na organização do culto monoteísta e no embelezamento da cidade, seus inimigos prosseguiam em seus planos.

Os sacerdotes de Amon iniciaram uma campanha conta a nova religião, embora mantendo a necessária cautela para não romperem de vez com o faraó.  Akhenaton não deu importância aos ataques e tomou outras medidas de impacto, como a de ordenar que no Egito só seria adorado um deus, Aton - medida que não foi acatada senão na capital. E enquanto o rei prosseguia na organização do culto monoteísta e no embelezamento da cidade, seus inimigos prosseguiam em seus planos. No exterior, o problema era resultante da expansão do império hitita, que rapidamente aumentava sua influência sobre as áreas tradicionalmente fiéis ao Egito, formando alianças com os Estados hostis, como a Babilônia e Assíria. No arquivo de Amarna foram encontradas cartas de reis aliados implorando a Akhenaton mais atenção e apoio militar. Esses assuntos não sensibilizaram o rei, voltado para sua cidade, seu deus e sua família, que ele adorava (isso fica patente nas representações da família resal, onde o soberano aparece abraçando e bejando as filhas e a mulher).

O que diferencia a religião adotada por Akhenaton da tradicional é sua concepção de um deus único, gerador de toda  a vida na terra, representado por um disco solar, com raios prodigalizando vida e bem-estar: uma religião universal, de bondade e amor, aberta a todos e dirigida para o momento presente, ao contrário do culto antigo, voltado para o além-túmulo. Akhenaton era totalmente contrário ao exercício da força, considerando a guerra como uma anomalia que deveria ser evitada a todo o custo. Essa postura deixava seus adversários estrangeiros livres para desenvolver suas políticas expansionistas e formar alianças tendentes a cercar o Egito, isolando-o de seus aliados. A principal obra da cidade era o Templo de Aton, de arquitetura baseada no Templo do Sol de Heliópolis. Pouco restou dele - foi derrubado após a morte de Akhenaton, por ordem direta do sumo-sacerdote de Amon. Pelas descrições, sabe-se que era constituído por uma série de salões sem cobertura, para que o Sol pudesse banhar os fiéis com seus raios, e que permitia acesso a todos os locais exceto um cômodo, fechado por altas paredes e exclusivo do sumo-sacerdote de Aton (o próprio rei). Segundo as inscrições, os intrusos morreriam ao penetrar no recinto sagrado, pois o mesmo era protegido por poderosas forças mágicas.
Colocada em um dos pátios, uma grande estela representava Akhenaton,  acompanhado de seus familiares, adorando Aton, em forma de disco solar. Foi descoberto nas ruínas do Templo por arqueólogos britânicos  após a 1ª Guerra Mundial.  Também foram encontrados alguns dos 365 pedestais ali existentes representando os dias do ano. Estes eram destinados ao recebimento das oferendas dos fiéis. Os alimentos, após serem consagrados pelos raios do deus, eram distribuídos entre os necessitados. Neste aspecto notamos mais uma profunda diferença com a religião tradicional, ávida de ouro e jóias destinadas a enriquecer as confraria de sacerdotes e as estátuas de Amon.

Akhenaton construiu mais duas cidades dedicadas ao Sol. Uma ficava na Etiópia, e era chamada Gem-Aton. Desta cidade existem alguns vestígios, decobertos por arqueólogos ingleses e italianos. A outra, chamada Mis-Aton, situava-se ao norte, talvez na Síria, mas não há dados acerca de sua localização. Ela é  citada  em apenas um documento de arquivo, onde se verifica que foram enviados dois artistas com a missão de erigir uma estela comemorativa.

Os intrigantes sacerdotes de Amon tiveram inúmeras oportunidades para atacar o rei, por sua impiedade pelos deuses tradicionais e por sua incapacidade em resolver os problemas políticos e militares que estavam ocorrendo junto às fronteiras do reino. O povo também não aceitava a religião monoteísta, adorando os deuses antigos;  para a maioria, Aton era apenas um outro deus. Afora esses problemas, o faraó separou-se de Nefertiti após  l5 anos de  matrimônio. Não conhecemos os motivos; sabemos apenas que a rainha abandonou o palácio real, seu marido e suas filhas, e retornou a Tebas. A função de suma-sacerdotisa de  Aton foi exercida por uma filha de Akhenaton, Meryt (cujo marido, Semenkhare, passou a ser co-regente do Egito, juntamente com o sogro). Existem diversas interpretações para a atitude de Nefertiti. A principal e mais verossímil é a de que ela teria se deixado influenciar pelos sacerdotes tebanos e abandonado tudo numa esperança de manter a vida, pois já estaria sendo organizado o assassinato do rei e daqueles que se mantivessem a seu lado. A deserção da esposa deve ter abalado o soberano, e a morte (provavelmente por assassinato) de seu genro e co-regente Semenkhare, ocorrida pouco depois, deixou-o praticamente só. Outra filha, Ankhsepaton, estava casada com um jovem de 12 anos, que talvez fosse filho de Akhenaton com uma princesa de um dos países aliados do Egito. O casamento entre irmãos era uma prática comum no Egito antigo, principalmente na Casa Real. O jovem chamava-se Tut-Ankh-Aton, nome que seria posteriormente mudado para Tut-Ankh-Amon.

O final do reino de Akhenaton foi trágico. Outra filha, a princesa Maketaton, morreu jovem, por razões desconhecidas. Abandonado pela mulher, traído pelos servidores e parentes, o faraó verificou que seus aliados tradicionais se bandeavam para o lado do rei dos hititas.Um dos seus principais aliados, Dushratta, rei do Mittanni, foi assassinado por membros de sua própria guarda, e seu país invadido pelos assírios, aliados dos hititas. A Síria, que durante séculos fora uma colônia egípcia, foi ocupada sem que Akhenaton tomasse qualquer providência de caráter militar. Ele limitou-se a escrever para o rei hitita, Suppiliuliuma, protestando timidamente contra aquela ação e propondo paz, pois a seu ver, a guerra deveria ser evitada a qualquer custo. O hitita respondeu que partilhava das idéias de  Akhenaton sobre a guerra, mas prosseguiu com seus planos de expansão territorial, a custa do Egito. Para os oficiais do exército egípcio, a situação era insustentável. Eles sabiam que ainda eram sificientemente fortes para enfrentar as agressão, mas o moral da tropa caía rapidamente. O rei era  o comandante nominal do exército, mas este, na realidade, estava sob o controle do general Horemheb, que em diferentes ocasiões pediu permissão ao rei para atacar os inimigos - autorização que Akhenaton sempre negou. A situação econômica do reino também era difícil. Sem poder contar com os tributos, que eram enviados enquanto o Egito dominava o Oriente próximo, o rei teve de diminuir o ritmo de construção em que se empenhara para criar novos templos de Aton, e a cidade de Akhenaton parou de expandir.

A morte de Akhenaton nesse momento não espanta. Não sabemos como ocorreu, mas o plausível é que ele tenha sido morto por alguém enviado pelos sacerdotes, ou pelos oficiais do exército, desejosos de passar à ação e reconquistar os territórios perdidos.

O novo faraó foi Tut-Ankh-Amon ("O protetor de Amon"), que subiu ao trono em Tebas, tendo entre seus acompanhantes a sogra e ex-rainha Nefertiti. Ele recebeu a dupla coroa real das mãos do sacerdote de Amon, que o cobriu de bençãos. Nefertiti viveu mais três anos ao lado do genro e da filha, não havendo registros sobre a sua morte. A cidade de Akhetaton foi abandonada e em seguida arrasada pelos soldados comandados pelo general Horemheb. De Akhenaton nada restou. Sua tumba e múmia nunca foram encontradas; é  mais provável que os sacerdotes de Tebas não tenham permitido o embalsamamento do corpo do rei, negando à alma o direito de retornar à vida (o que constituía a mais terrível vingança na religião tradicional).
O grande sonho de Akhenaton durou apenas 17 anos. Sua religião monoteísta foi totalmente extirpada e o culto de Aton proíbido em todo o Egito. O templo que construíra em Tebas foi arrasado e as três cidades criadas para a adoração de Aton derrubadas, e proibiu-se aos egípcios a visitação às ruínas. A herança de Akhenaton também foi trágica. Nefertiti, sobreviveu a seu esposo por apenas três anos. Quanto ao genro, Tut-Ankh-Amon, também morreu jovem, cinco anos após ser colocado no trono - destino que tiveram os familiares de Akhenaton e os sacerdotes que tinham servido ao Deus-Sol. Apenas a princesa Ankhesenamon, cujo nome anterior fora Ankhesepaton, viúva de Tut-Ankh-Amon, viveu mais tempo. Os sacerdotes necessitavam dela para, através de artíficios, criar condições para que alguém de confiança subisse ao trono como soberano legítimo, graças ao matrimônio com uma princesa de sangue real, filha de faraós. No ano de 1335 a.C. o trono do Egito estava ocupado por um novo faraó. Seu nome: Horemheb. Posto: general. Qualificação: fiel aos sacerdotes de Amon, sem jamais ter tido ligações com o culto herético de Aton. Abençoado pelo clero, protegido pelos deuses, ele governaria por mais de 40 anos, morrendo, naturalmente, de velhice. Com Horemheb extingiu-se a XVIII  Dinastia, pois os deuses não lhe deram herdeiro. Sua morte abriu caminho para a ascenção dos faraós guerreiros da XIX  Dinastia, os Ramsés, que derrotariam e destruiriam o império hitita.



TEXTO ADAPTADO DA REPORTAGEM DE AURÉLIO M. G. DE ABREU-REVISTA PLANETA.

AKHENATON É CONSIDERADO O FUNDADOR DA ORDEM ROSA-CRUZ.